quinta-feira, 12 de abril de 2012

a vizinha do 7ºC


esta minha vizinha, de dois andares abaixo, deixa-me o corpo em água. desde que para aqui se mudou, há cerca de um mês atrás, que tenho as noites ocupadas sem dormir.
de cada vez que de dia me cruzo com ela, o que acontece quase todos os dias, é certo e sabido que perco o sono à noite. não interessa se é dia de sol ou dia de chuva; o certo é que não vou dormir, se a vir.
por vezes, quando saio, pela manhã, nem sei se me cruze com ela, ou se me descruze. sei lá se é do sorriso ou do olhar, do leve oscilar da sua loira e farta cabeleira ou do seu menear.
sei que, é certo e sabido, quando, pela manhã, passo por ela... à noite perco o sono e não mais consigo dormir.
depois, durante o dia, pareço até semi-adormecido; mas não. estou apenas meditabundo, imaginativo a pensar em como hei-de arranjar uma forma de dormir essa noite. como hoje! é que, pela manhã, quando saía para o trabalho, me cruzei mesmo com a vizinha loira que vive já ali, bem perto, apenas 2 andares abaixo de mim.
ao fim do dia, no regresso a casa, vou ainda com ela, sedosa e transparente, no olhar. quem me olha, apesar do silêncio, sempre me diz:
estás feliz, António! vê-se bem que já conheces mais que a cor do seu cabelo ou a cor da sua pele”
ou, então, acabam por deixar sair com um cúmplice piscar, um
estás feliz, António! diria que, esta noite, jantaste em sua casa. talvez até já… conheças toda a casa.”
penso, então, para mim, como a leitura de palavras de silêncio pode ser tão inexacta e como tantas vezes somos levados ao engano por palavras da expressão.
ainda um tanto preocupado com a forma como ocupar esta noite, entro a soleira do prédio. avanço mais uns passos e vejo a minha vizinha de dois andares abaixo, bastante menos leve do que pela manhã, carregada com o peso das canseiras e das compras do dia:
dás-me aqui uma pequena ajuda, por favor – pede-me ela, enquanto me olha, inquisitiva, preparando-se para entrar no elevador.
peguei nos sacos e segui-a devagar, com um sorriso confiante sobre o olhar e o decote da camisa entreaberta. pressionei no número sete. quando chegámos, abriu a porta e perguntou-me:
como te chamas?”
o meu nome é António.”
pois então anda daí, António! esta noite jantas comigo.”
Imagem: ciência hoje
Joe Pass & N H O Pedersen - Have you met Miss Jones?

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